quinta-feira, 9 de setembro de 2010

A BOA POLÍTICA

Existem coisas na vida que realmente não dão ibope. Imagine o seguinte: uma ocupação ilegal de casas embargadas por órgãos competentes e os representantes dos Três Poderes reunidos juntos com os representantes dos moradores na tentativa de se resolver a lide? A isso dou o nome de boa política.
Sem barulho, sem estardalhaços, tudo na maior tranqüilidade. Foi assim que a reunião de quase duas horas transcorreu ontem (08/09/10) na Câmara Municipal de Bom Jesus do Norte, sul do Espírito Santo.
De forma brilhante, o vereador Toninho Gualhano fez a abertura da reunião citando o exemplo do líder sul-africano Nelson Mandela, que sem violência, conseguiu acabar com a segregação racial naquele país e tornou-se o primeiro presidente negro na recente história da África do Sul, apesar de ter passado vinte e quatro anos na prisão.
O prefeito da Cidade, o médico cardiologista doutor Adson, ouviu atentamente as explanações tanto dos vereadores quanto dos moradores, e na sequência deu a sua versão dos fatos. Afinal, como chefe do executivo uma atitude que visava restabelecer a ordem deveria ser tomada, ainda que tal atitude não fosse a que ele gostaria de ter tomado naquele momento. Mas lei é lei, não se pode prevaricar quando sem tem a obrigação de zelar pelo bem comum, pois corre-se o risco de ser responsabilizado civil e criminalmente por ato que deveria ser tomado. E foi o que ele fez. Acionou a Justiça para que esta restabelecesse a posse dos imóveis ocupados ilegalmente. Disse também, que reconhece a necessidade daquelas pessoas, mas que o município também tem outras pessoas que precisam tanto quanto aquelas ou mais ainda, e isso não pode ser negligenciado pelo Poder Público.
Complementando o que dissera o prefeito, o vereador Aquiles Zanon igualmente lamentou a situação dos moradores naquela situação e num belo exemplo de homem público e que com isso justificou os votos recebidos na última eleição, deu uma aula de direito e cidadania aos presentes. De forma ímpar, disse que sua preocupação ali não era com votos, mas sim esclarecer verdadeiramente às pessoas os riscos que suas ações tresloucadas podem ter em suas vidas. Reafirmou ainda que o Legislativo esta trabalhando célere e incansavelmente no sentido de aprovar leis que beneficiem os munícipes de maneira global, principalmente àquelas relativas às moradias, porém, existem trâmites que devem ser cumpridos e isso independe daquela casa.
O vereador Marcão também foi bastante contundente em suas falas, além de demonstrar muito interesse em sanar o problema daquelas famílias. Lamentou a ausência dos outros vereadores ao encontro e agradeceu a presença dos que ali se encontravam, manifestando solidariedade a dor daquelas pessoas, mas reafirmando que a lei é para ser cumprida por todos, caso o contrário, viveríamos num estado de caos total, citando o exemplo de alguns países da África onde isso acontece.
Participação tímida teve os vereadores Flávio e Sílvia, o que não os desqualificam, ao contrário, as suas presenças ao encontro foram muito importantes. Quanto ao vereador Flávio, irritou-se quando os moradores foram comparadores a criminosos. Mas, caro vereador, quem age contrário à lei é o que? Criminoso, afinal, num país democrático de direito os fins não podem justificar os meios e ainda não criaram um adjetivo por assim dizer, “mais bonito”, para qualificar quem age dessa maneira.
Por fim, representando o Judiciário tivemos a presença do doutor Leonardo, homem austero, que falou em nome da excelentíssima juíza de direito da comarca, doutora Maria Isabel. Sua presença à reunião foi muito profícua, pois esclareceu aos presentes o posicionamento da Justiça ante os fatos, reafirmando os valores que norteiam uma sociedade e do papel do Judiciário em resguardá-los, independente das partes envolvidas.
No final, acredito que todos saíram satisfeitos; uns mais outros menos, mas como dissera anteriormente, esse encontro deve ser visto com os olhos da boa vontade e também da sua singularidade. Pude perceber que apenas um ou outro estavam preocupados com outros temas que não os que foram abordados, fato típico se levando em consideração às circunstâncias e os interesses envolvidos, mas isso é outra história.

A luta continua.

Marcelo Adriano Nunes de Jesus

terça-feira, 7 de setembro de 2010

NA PERMANENTE PERSPECTIVA DO NADA

Posso dizer que sempre gostei de assistir aos programas eleitorais gratuitos que de quatro em quatro anos invadem nossos lares. As razões para esse mórbido prazer são várias, mas foi exatamente num desses programas que volvi meu olhar para a minha atual condição.
Sentado no sofá de minha casa assistindo à tv, apareceu um casal narrando todas as suas dificuldades de vida. Tratava-se de um pedreiro e sua respectiva esposa, uma diarista da Bahia. No programa, eles falavam da precariedade que eram suas vidas antes do atual governo. Segundo eles, em oito anos tudo mudou em suas vidas. Mesmo sem estudos, passaram a ter emprego, casa própria, um carro relativamente novo, sua filha possuía notebook, enfim, uma vida normal como todos deveriam ter, bem “Alice no País das Maravilhas”.
Não pude deixar de fazer uma comparação daquela narrativa com a minha própria vida. Sou professor com curso de especialização e mestrado incompleto - ou estudava ou trabalhava -, e vivo na permanente perspectiva do nada, apesar de continuar estudando. Não tenho casa própria, meu carro me foi presenteado pelos meus tios, minhas filhas igualmente não possuem casa própria muito menos computador portátil. Não posso ajudar minha filha mais velha a pagar um cursinho pré-vestibular e todo mês é a mesma coisa: meus tios mandando dinheiro para que eu possa sobreviver porque meu salário é insuficiente.
Em julho último adoeci, e se não fossem meus tios e meu irmão não sei o que seria, pois o hospital cobrou um depósito de valor bem alto para a minha realidade para fazer o procedimento cirúrgico, já que meu plano de saúde se encontrava em carência e o cirurgião não atendia pelo SUS, além de não haver tempo para buscar outro hospital ou os tribunais para resolver a lide.
Recentemente fui convocado em um outro concurso que prestei para professor do Estado do Rio de Janeiro. Fui levado a desistir porque os colégios que me foram oferecidos em Campos (RJ) tornavam impossível assumir aquela matrícula. Isto porque teria de percorrer 250 quilômetros por dia para dar aula, sendo que deveria ir três vezes por semana àquele município, ou seja, o salário de setecentos reais brutos ficaria todo na estrada gastos com pedágios, combustível e alimentação.
Imaginei que já que tenho uma matrícula no estado haveria a possibilidade de uma remoção para o município em que estou lotado, mas a inércia aliada à má vontade dos funcionários da Coordenadoria que me apresentei, tornaram impossível qualquer modificação no que me fora apresentado: ou aceitava e daí após três anos tentava a remoção, ou desistia. Optei pela segunda opção.
Realmente meus valores são outros. Não sonho com carrões, viagens maravilhosas, mansões, nada disso. Sonho como qualquer brasileiro simples. Sonho em ter dignidade, o que me falta hoje. O estado não apoia o professorado em nada. Não existe nenhum fomento à qualificação do servidor, à parte aqueles que atendem única e exclusivamente os interesses do próprio estado, ou seja, cursinhos de informática para que o professor tenha mais uma atribuição: lançar as notas dos alunos no sistema e com isso extinguir o cargo de secretária escolar. Bravo! No Rio de Janeiro, por exemplo, não existe um programa de apoio ou incentivo aos professores que desejam especializar-se em cursos de mestrado ou doutorado, acredito que essa também seja a realidade de todos os estados brasileiros e do distrito federal.
Com tudo isso, esses programas eleitorais – à parte as inúmeras mentiras veiculadas - têm me auxiliado na construção de uma nova convicção: abandonar o magistério, o que não ocorrerá sem dores, pois amo a minha profissão, mas em breve vai acontecer independente dos resultados que estou aguardando.
Gostaria de deixar consignado que não sou porta-voz e não represento a classe dos professores. Represento a mim mesmo. Ademais, não se pode falar em classe quando há ausência de consciência, referindo-me aos ensinamentos do velho Marx e que são bastante pertinentes ao quadro.
Não obstante, parece-me também que quase nada do que ajudamos a construir em salas de aulas é aproveitado pelos destinatários como deveriam. É comum ouvir pessoas dizendo que não votarão em fulano ou sicrano porque suas chances de vitória são praticamente nulas. É muito triste para um professor, seja ele de qual área for, ouvir uma coisa dessas. Se meus candidatos têm ou não chances de vitória são as urnas que dirão. Não acredito em pesquisas de opinião, ainda que em muitos casos elas reflitam fielmente o povo brasileiro. Cada povo tem o governo que merece.
Por fim, independente do que eu venha a fazer, será feito com a maior dignidade e zelo, mesmo que eu opte em colocar uma carrocinha de cachorro-quente na esquina, ideia que não descarto. É preciso coragem para mudar. Quando assinei a desistência da segunda matrícula, muita gente comentou entre os cantos que eu era louco em abandonar uma matrícula no estado, para eles eu digo que louco é quem me diz e não é feliz, eu sou feliz, só me falta dignidade.

A Luta Continua.

Marcelo Adriano Nunes de Jesus
7 de setembro de 2010