Como saborear um prato de comida com prazer quando centenas de pessoas não têm sequer uma mesa para sentar em razão de subitamente terem perdido todo o pouco que tinham?
O drama dos moradores de São Gonçalo e da área metropolitana do Rio de Janeiro mostrou ao Brasil muito mais que políticas públicas ineficientes voltadas para o setor de habitação e segurança pública: homens públicos que deveriam estar na cadeia, atrás das grades, em razão de sua falta de responsabilidade e omissão, pois só se preocupam com o voto e em se perpetuar no poder.
Mas a tragédia mostrou também a solidariedade de uma gente há muito esquecida, marginalizada e apontada como culpada de tudo de ruim que acontece em sociedade, a começar pelos policiais e passando pelos menos favorecidos pela sorte ou pelo destino.
Quem não gosta de “pulíçia” (sic) é bandido e governador. No primeiro caso, dispensa esclarecimentos devido ao óbvio, mas quanto ao segundo, ele precisa de um bode expiatório para sua incompetência no trato com a res publica e com a ausência de políticas eficientes, seja esta no policiamento ou em práticas que evitem esses dramas, como a compulsoriedade na remoção de casas em áreas de risco. Mas sabemos que tal ação implicaria em perda de votos, e isso eles não querem. Vide o próprio estado do Rio de Janeiro. Como exemplo, cito Bom Jesus do Itabapoana, município do noroeste fluminense distante 330 quilômetros da capital.
Lá, a Polícia Militar sequer tem viatura para patrulhamento. Na verdade, tem apenas uma, um VW Gol, para cobrir uma área 598, 84 km². Além disso, não existe sequer uma Secretaria de Meio Ambiente e uma prefeita que assumiu o poder mesmo tendo ficado em terceiro lugar nas eleições municipais, mas isso é assunto para outra ocasião.
Quanto à Polícia Civil, possui dois veículos da marca Renault modelo Mégane ano 2010, fora as viaturas descaracterizadas. Nada contra a Polícia Civil, ao contrário, mas isso é no mínimo estranho, pois o patrulhamento ostensivo cabe à Polícia Militar, e o mais coerente seria que ela tivesse prioridade na distribuição de viaturas para poder cumprir o seu papel constitucional, mas não é isso que acontece no estado do Rio de Janeiro.
As últimas tragédias provocadas pelas chuvas no Rio de janeiro trouxeram também à tona uma outra realidade não menos cruel que a dos policiais militares: a dos bombeiros. Homens trabalhando à exaustão porque o número de combatentes é insuficiente e é preciso dar conta da árdua tarefa de salvar vidas ou encontrar corpos e sobreviventes: desempenham sua função por amor à vida e ao próximo. Se uma tragédia como a do Morro do Bumba, em São Gonçalo, tivesse ocorrido em outro lugar e nas mesmas proporções, seria um caos, pois não há número suficiente de bombeiros e equipamentos para atender a população, e isso me foi dito por um oficial de alta patente da corporação. Porém, o mais estúpido, é que o governo do estado do Rio de Janeiro demorou muito para aceitar a ajuda disponibilizada por outros estados e pela própria União, o que se aceito, poderia minimizar os dramas daquelas e de outras pessoas que ainda estão sofrendo.
Mas à parte a incompetência daqueles que teriam por obrigação evitar tais tragédias ou minimizar os danos às vítimas, a começar pelo governador do estado, Sérgio Cabral, a sociedade civil de Bom Jesus do Itabapoana (RJ) e Bom Jesus do Norte (ES), se mobilizaram e deram um bonito exemplo de solidariedade. Homens, mulheres e crianças atenderam ao apelo e participaram ativamente da campanha que foi iniciada para ajudar os vitimados pelas chuvas. E fizeram bonito.
Pelos vários bairros por onde andei, notei que os lugares mais carentes eram onde as pessoas mais participavam. Cheguei a receber um saco de arroz abaixo da metade. Pensei em não aceitar, mas por outro lado, sabia que se fizesse isso deixaria a doadora muito triste, e mesmo com o coração em pedaços e com os olhos marejados, aceitei.
Também foi muito bonita a participação das crianças e adolescentes das escolas que visitei. Todos queriam participar e deram um belo exemplo para os adultos naquilo que se convencionou chamar de “CIDADANIA”, mas pra mim foi muito mais que isso: foi uma verdadeira prova de amor ao próximo.
Finalizando, não poderia deixar de mencionar a importante participação da 2ª Companhia da Polícia Militar do 29º BPM (Itaperuna).
Todos, independentes da patente, participaram muito além daquilo que esperávamos; seja pedindo doações, solicitando transporte ou cedendo espaço para o armazenamento dos donativos. Realmente, quem não gosta de polícia é bandido. Nossa polícia militar está muito acima das críticas que lhes são feitas, assim como a polícia civil, que igualmente é vítima de reiterados desgovernos.
Por último, fica aqui registrado o meu agradecimento a todos que participaram desta campanha em prol da vida. Opto em não mencionar nomes exatamente para não incorrer no erro de deixar alguém de fora. Mas sei que todos preferem que fiquem assim: no anonimato. Mas que o mundo saiba que temos um povo lindo, participativo, e que independente de fé ou ausência dela, são solidários à dor alheia, e isso, é o que vale.
A LUTA CONTINUA.
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